Legalizar o comércio ambulante nos trens?

Por um usuário do trem

No dia 25/11/19, o governo do estado de São Paulo anunciou um projeto de legalização do comércio ambulante nos trens da CPTM, em parceria com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas). Segundo informações do governo, os primeiros cursos de formação com ambulantes já teriam inclusive iniciado. Qual a intenção do governo com essa medida? Esse pequeno texto levanta algumas questões a respeito.

Em primeiro lugar, vale recordar que esse mesmo governo que anunciou a legalização do comércio, está combatendo fortemente o comércio ambulante (como na foto da notícia: “contra o comércio ilegal, CPTM e Sebrae vão capacitar os vendedores informais”). No início de 2019, o Presidente da CPTM Pedro Moro anunciou como prioridade de seu mandato acabar com o comércio nos trens. Por que agora o projeto de legalizar? Ao meu ver, há duas razões principais: primeiro porque é muito difícil acabar com esse comércio só através da repressão. Mesmo com a intensificação das abordagens e aumento das operações, o comércio não para, porque são milhares de trabalhadores que dependem dos trens para tirar seu sustento. Em segundo lugar, porque o comércio nos trens é muito rentável, então é interessante para a CPTM legalizá-lo e passar a alugar espaços que hoje não são utilizados do ponto de vista comercial. Pro governo e pra CPTM, a legalização mataria dois coelhos com uma cajadada: acabaria com o comércio ilegal e ao mesmo tempo tornaria esse comércio rentável pra eles.

Pra quem é marreteiro de trem, vale se perguntar: será que terá espaço pra todo mundo vender de forma legalizada? Segundo informações do governo, a venda legalizada seria só nas plataformas. E os que não conseguirem o ponto e continuarem vendendo nos trens? Por que, ao mesmo tempo em que o governo anuncia a legalização, ele põe PM nas estações? A estratégia do governo é de mão dupla: envolver parte dos marreteiros nos cursos e reprimir os que se mantiverem ilegais. O que é cruel dessa estratégia é que muitas vezes os próprios marreteiros legalizados passarão a caguetar os ilegais, já que esses continuarão vendendo produtos mais baratos e sem pagar taxas, diferentemente dos cadastrados. No carnaval deu pra ver muito disso: ambulantes cadastrados da Skol caguetando os ilegais pra polícia. Então a legalização é uma forma também de dividir os marreteiros.

Pra quem gosta de um shopping trem, a legalização também não é boa, porque aumentará os preços dos produtos. Compramos de marreteiros justamente porque é mais barato, se houver cadastro, haverá mais imposto e tabelamento de produtos específicos que poderão ser comercializados. Somos contra a criminalização do comércio ambulante e contra a violência contra os marreteiros, mas não podemos ser ingênuos de achar que o governo quer ajudar ou melhorar a vida dos marreteiros e da população com essa medida. Empresários e políticos fazem sempre o possível pra arrancar o máximo da gente, seja através do nosso trabalho, seja através dos impostos e das tarifas que recaem sobre nós (como a do transporte que aumentou para R$4,40).